05/12/2014

Brincar às Escolas (SPCL, Nov. 2014)


 

 SINDICATO DOS PROFESSORES NAS 
COMUNIDADES LUSÍADAS 

BRINCAR ÀS ESCOLAS

Segundo as declarações feitas na Assembleia pelo Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas no passado mês de outubro, durante os cerca de 35 anos de Ensino Português no Estrangeiro (EPE) sob tutela do Ministério da Educação, os professores e alunos nada mais fizeram do que andar a brincar às escolas, porque, ainda segundo o Sr. Secretário de Estado, não havia programas, nem manuais adequados, nem certificação.
Realmente, é de espantar que tantos alunos tenham obtido bons empregos porque dominavam o Português, aprendido com livros de má qualidade didática e com professores que não sabiam bem o que andavam a fazer, porque nem programas tinham.
E também admira que muitos alunos houve que foram frequentar Universidades ou Institutos Superiores em Portugal ou no estrangeiro, apresentando um certificado que, ao que parece, não existia, embora valendo alguns créditos para matrícula no ensino superior.
Mais espantoso ainda é o facto de os atuais alunos de 9° ou 12°ano, que obtêm ótimos resultados nas provas de certificação do Instituto Camões, terem aprendido alguma coisa naqueles tempos soturnos, segundo o Sr. Secretário de Estado, em que ninguém sabia bem o que se andava a fazer, ou mesmo se algo se fazia, no Ensino Português no Estrangeiro.
Isto só até 2010, claro, porque a partir daí, tudo mudou. O EPE saiu da tutela do Ministério da Educação e passou a ser responsabilidade do Ministério dos Negócios Estrangeiros, via Instituto Camões.
E o referido Instituto, que só conhecia o ensino do Português como língua estrangeira, tratou logo de tomar medidas para pôr ordem no caos do EPE, despedindo, em dezembro de 2011, 49 professores e deixando, depois de poucos meses de atividade letiva, mais de 5.000 alunos sem aulas. Depois desta redução, o Camões continuou a “arrumar a casa”, tarefa agora mais fácil por haver menos alunos e menos professores, instituindo a propina de pagamento obrigatório para frequência dos cursos, medida que fez desaparecer logo mais de 800 alunos na Alemanha e cerca de 9.000 a nível mundial.
Claro que a esta redução de alunos correspondeu o despedimento de 30 professores em 2012, ao qual se seguiram despedimentos anuais de 20 e mais docentes, tornados desnecessários devido a forte redução do número de horas letivas e também ao número cada vez maior de alunos exigido para formar um grupo.
Assim, com a casa Ensino Português arrumada, porque quase vazia, terminou-se também com o brincar às escolas e passou-se a brincar com as escolas, isto é, com os professores, os pais e os alunos.
Aos pais, foi prometido que a propina lhes iria garantir um ótimo ensino, com manuais de qualidade e uma certificação de alto nível. Aos professores, foi prometida contratação por dois anos e formação adequada.
Foi aí que a brincadeira se tornou séria, porque bastou um curto espaço de tempo para constatar que afinal os alunos cada vez tinham menos tempo de aula, os manuais eram de utilização impossível, especialmente para os alunos do primeiro ciclo, e a famosa certificação nem sequer era reconhecida pelas entidades escolares locais.
Quanto aos professores, ficaram a saber que, para manterem os postos de trabalho, tinham de conseguir alunos suficientes com os pais a pagar, porque senão nada feito. E a formação adequada revelou ser um amontoado de conceitos desfasados trazidos por indivíduos com currículo universitário, mas sem qualquer experiência ou conhecimentos sobre o ensino do Português nas Comunidades.
Mas como realmente não se brinca com coisas sérias, o Camões, notando que a brincadeira já tinha ido longe demais e podia dar maus resultados, decidiu que afinal os culpados da má qualidade de ensino e das horas letivas reduzidas eram, afinal, os professores, porque estavam a trabalhar menos do que deviam. Vejam só que vergonha! Então tinham-nos obrigado a ensinar, em grupos amontoados, alunos de todas as idades, tinham-nos obrigado a trabalhar em mais escolas e a passar horas sem fim em transportes, tinham-nos obrigado a escrever relatórios em que muitos professores alertaram, sem resultado, para o mau estado do ensino e agora os sem-vergonha trabalhavam menos do que deviam, prejudicavam os alunos e intrujavam os pais! Escandaloso e inaudito.
E para terminar, muito a sério. Não foram os professores, que sempre deram e continuam a dar o seu melhor, trabalhando em condições extremamente difíceis, que destruiram o ensino no estrangeiro e o puseram num estado de descalabro total.
Quem leu este artigo até aqui, conhece os responsáveis. Responsabilizem-nos. Com coisas sérias não se brinca.


Nuremberga, 20 de novembro de 2014

Maria Teresa Duarte Soares

Sindicato dos Professores nas Comunidades Lusíadas

10/06/2014

Declaração do 10 de Junho (SPCL, 10/06/2014)


 
DECLARAÇÃO  DO  10  DE  JUNHO

DIA  DE  CAMÕES,  DE  PORTUGAL  E
DAS  COMUNIDADES  PORTUGUESAS

Celebra-se hoje o Dia dos Portugueses nas Comunidades espalhadas pelo mundo.
É de reconhecer, e louvar, a coragem daqueles que deixaram o seu país de origem em busca de melhores condições de vida em países estrangeiros, dos quais muitas vezes não conheciam língua nem costumes, e que mesmo, em condições pouco favoráveis e num meio estranho, foram capazes de sobreviver, trabalhar, criar os filhos, enfim, construir, num país novo, uma nova vida.
São estes portugueses, muitos ainda por nacionalidade, e outros já só por ligação afetiva, que merecem ser hoje homenageados, pela força e capacidade de adaptação demonstradas, e também pela sua dedicação ao país de origem, um país que, por mais distante que se encontre, não esquecem, sempre envidando esforços para manter vivas a Língua e Cultura Portuguesas.
Portugal é, infeliz e tradicionalmente, um país de emigração, facto que não pode ser origem de qualquer sentimento de orgulho, visto que só um país que não tem capacidade de oferecer aos seus cidadãos meios para ganhar a vida dignamente os força à emigração.
São já mais de 121 mil os portugueses que emigraram durante a crise da austeridade, ultrapassando, em 2012, um máximo histórico que só tinha sido alcançado em 1966, uma época caraterizada pelos horrores da ditadura, da guerra e da fome.
Fala-se agora de uma “nova diáspora”, à falta de melhor designação para reconhecer que, afinal, muitos portugueses já não têm condições para continuar a viver no seu país.
De novo se fala de quem parte e de quem fica, de novo surge a saudade e os receios de que o novo começo não corra bem.  
E também de novo se constata que Portugal não apoia devidamente os seus cidadãos no estrangeiro, com os serviços consulares a funcionar precariamente e reduzidos ao mínimo, e com os cursos de Língua e Cultura Portuguesas alvo de reduções anuais, conjuntamente com a aplicação da vergonhosa taxa de frequência, a “propina”, de caráter anticonstitucional e antidemocrático, que obriga os pais portugueses no estrangeiro a pagar para que os seus filhos possam frequentar os cursos de língua e cultura de origem, cursos esses cada vez em menor número e ostentando um decréscimo crescente da qualidade de ensino.
Este conjunto de tristes circunstâncias nada mais é que o amargo fruto das políticas economicistas e da falta de vocação e interesse do Camões, Instituto da Cooperação e da Língua, em manter viva a língua de herança no estrangeiro, o Português nas Comunidades, transformando-o em língua estrangeira, com fito em objetivos elitistas, servindo interesses políticos mal orientados e apoiando ações de caráter predominantemente carreirista, visando o futuro profissional de alguns, mas sem intenção de servir, minimamente, os interesses das comunidades portuguesas no estrangeiro.
O ensino da Língua e Cultura Portuguesas, nas pequenas localidades, onde era exatamente mais necessário devido ao isolamento em que os portugueses se encontram, está atualmente quase extinto, em consequência dos princípios de estrangulação progressiva preconizados pela Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, para quem só os locais com grandes concentrações de emigrantes parecem ter direito a atenção e reconhecimento, insistindo numa política mal direcionada e que terá como consequência gerações futuras de indivíduos de origem portuguesa, mas com passaporte estrangeiro, ignorantes das suas raízes e da sua herança linguística e cultural.
A força das Comunidades Portuguesas está nelas próprias, na sua determinação de não esquecer uma Pátria que, muitas vezes, as esquece.
Hoje, e sempre, a nossa homenagem a todas as portuguesas e portugueses no estrangeiro, radicados ou recém-chegados, sós ou com família, saudosos ou adaptados, cidadãos de uma nova pátria fora da Pátria, a pátria das Comunidades Portuguesas.


10 de junho de 2014
Nuremberga, Alemanha


Maria Teresa Nóbrega Duarte Soares

Secretária-Geral do SPCL